Assinatura eletrônica: chave ICP-Brasil não é necessária para STJ
No final de setembro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Recurso Especial nº 2149442-PR (“Recurso”), decidiu que o uso de entidade não credenciada na chave ICP-Brasil para realizar assinatura eletrônica em título de crédito tem validade jurídica. Confira a seguir os detalhes da decisão!
O Recurso, interposto por um FIDC (“Recorrente”) contra uma pessoa física (“Recorrido”), teve por origem uma ação de busca e apreensão fundada em uma Cédula de Crédito Bancária (CCB) com pacto de alienação fiduciária, então documentada e assinada eletronicamente pelas partes através da plataforma Clicksign (sem certificado digital com chave ICP-Brasil). A ação havia sido proposta pela Recorrente (também credora da CCB) em desfavor do Recorrido (devedor da CCB).
No âmbito da ação de busca e apreensão, o Juiz de 1º grau extinguiu o processo sem resolução de mérito com fundamento na “inviabilidade de validar e/ou autenticar as supostas assinaturas eletrônicas do contrato e do endosso da cártula após tentativa, de ofício, em realizar a validação”. A Recorrente apelou, tendo sido mantida a decisão de 1º grau, além disso, os embargos de declaração foram rejeitados.
Assim, a Recorrente interpôs o Recurso, argumentado que a decisão violava o art. 10, §2º da MP 2200/2001, bem como que a plataforma utilizada tinha sido estipulada como válida pelas partes na emissão da CCB.
Nesse âmbito, a Relatora, Ministra Nancy Andrighi, entendeu que o processo de certificação por sistema ICP-Brasil não exclui outros meios de validação jurídica de documentos e assinaturas eletrônicos, o que está expressamente previsto no §2º do art. 10 da MP 2200/2001.
Assim, ainda que a Lei 14063/2020 tenha previsto níveis de segurança para a assinatura eletrônica (simples, avançada e qualificada), entendeu a Relatora que a intenção do legislador foi criar níveis diferentes de força probatória das assinaturas eletrônicas e, ao mesmo tempo, conferir validade jurídica a qualquer tipo de assinatura eletrônica, levando em consideração (i) a autonomia privada; e (ii) a liberdade das formas de declaração de vontades entre os particulares.
Não obstante, a Relatora argumentou que o reconhecimento de validade jurídica e força probante de documentos assinados e emitidos eletronicamente com nível de segurança de qualquer tipo, desde que seja possível inferir ou auditar a assinatura ou o documento, já é um posicionamento que vem sendo adotado pelo STJ.
Ainda que a Ministra entenda que a assinatura eletrônica avançada (como a usada no caso) possua presunção menor de veracidade do que a qualificada (que usa Chave ICP-Brasil), a primeira possui carga razoável de força probatória e, mais importante, validade jurídica idêntica a um documento com assinatura física.
No caso, tendo as partes acordado expressamente que a CCB seria assinada por plataforma indicada pela Credora, e tendo a Credora indicado a plataforma Clicksign, não há que se falar que a plataforma não seria válida por não ter Chave ICP-Brasil. Além disso, há presunção de acordo de vontades quanto à utilização do método indicado.
Já com relação a autenticidade da assinatura do Recorrido, aduz a Ministra que o relatório da plataforma consta com diversos fatores de validação. Assim, o fato de o Juízo de 1º Grau não ter conseguido validar o documento não é motivação suficiente para se presumir adulteração das assinaturas por duas razões: (i) não é papel do Juízo realizar tal conferência, o que deveria ser feito por uma das partes (a participação do juiz é vetada pelo art. 139, I do CPC); (ii) há elementos suficientes que indicam a veracidade da assinatura. Até mesmo porque o documento utilizado pelo Juízo para realizar a conferência teria sido retirado dos autos (cópia) e não originalmente recebido pelas partes, sendo que somente este poderia indicar a real autenticidade do documento.
Por fim, entendeu a Ministra que tanto a assinatura avançada quanto qualificada são válidas, se diferenciado apenas no aspecto da força probatória, motivo pelo qual conheceu e deu provimento ao recurso, anulando o acórdão recorrido e determinado a devolução dos autos ao juízo de origem para que procedesse a ação de busca e apreensão.